José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

27.6.22

há outras distâncias outras disciplinas

Pintura: J. A. M.


(…)depois, também há outras distâncias outras disciplinas: a respiração ritmada no peito ao som dos longínquos tambores celestes não são perto nem longínquas as estrelas como agora as gotas de chuva hipnotizadas nos vidros das janelas.
Ainda que todas as luzes respirem só por dentro, acontece ás vezes a dor de ser humano alisada como um lençol sobre os joelhos, com o olhar preso à vastidão das pequenas ondas visíveis.
Ao olharmos para o mar sentimos como tudo isto é uma parte de nós mesmos.

 

21.6.22

( a um amigo pintor)

Pintura. "O Centro". J. A. M. 

 

É alguém que procura. Vinte e tal anos, uma água no corpo agitada em marés, a enorme quantidade de animais lá dentro uns em matilha outros solitários e secretos, outros ferozes outros mansos, com 4 patas a correrem solenes pelas paredes interiores e a desaguarem nas pinturas.

No meio de tantas ilhas uma súbita inspiração: haverá um desígnio para mim? Qual o voo que por vezes acorda uma espécie de suspeita muito íntima que me anuncia sem nomes? Qual a fonte destas inquietas descobertas?

Entretanto os dias atropelam-se, as noites longas possibilitadas pelos corpos que recusam o sono, os amigos que se aproximam e se afastam, a indefinível energia que dá movimento a tudo.

Se houvesse uma voz bem clara que gritasse no meio da noite, podia acontecer um tremendo pavor ou uma paz impossível. Com vinte e tal anos tais milagres são passíveis, e fugazes: demasiadas vozes descem juntas porque há sempre um vaso de luz aberto às novidades. É este vaso que transportamos pela vida a fora.

E, é assim a caminhada até 1 dia: é preciso construir um tema que nasça do fundo, uma linha que se prolonga ao mesmo ritmo, repetir o hábito que vem de si próprio e esquecê-lo para haver um outro, escutar o rumor do seu rio só seu, caminhar em companhia com os sonhos que nos acordam ao longo da idade.


R. T. - 7-07-2020

 

15.6.22

Ilhas ligadas

Pintura: J. A. M.

 

Às pessoas nómadas nos corpos e nas almas
um beijo indelével no rosto ausente
intervalo onde tocamos juntos
a íntima unidade no coração das coisas.

Sobre as infindáveis ciências dos homens
pousamos a luz urgente de outros olhos
desce sobre nós
a lucidez dos universos vivos.



inO Triângulo de Ouro - Editora Justiça e Paz.1988.
Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores.1987)

 


5.6.22

bastou um sorriso

Pintura. ÁRVORE de SÓIS: J. A.M.

 
















No meio dos dias, por vezes, a surpresa de um coração desprotegido
cercado por uma luz sem nomes.
Um rosto caído em cascata no olhar desnudado como se uma estrela
longínqua estivesse a falar.
 
Bastou um sorriso.
 
Por vezes, a inesperada vida deslumbrada por um encontro ao acaso
numa rua qualquer, onde arde a fulgurante e permanente chama do Mundo.