|
Ruínas da Igreja de São Matias, Alcântara ( 1647). Foto: j. a. m . |
Ponta d’Areia ( Br.)
Estou na Ponta d’Areia [1]. Deitado ou sentado à sombra, aí uns 30 e tal graus. O guarda-sol é cor de mangas maduras e eis à minha frente o mar vivo e aceso. Do céu vários azuis luminosos descem naturalmente sobre tudo o que é vida.
À minha volta, o povo espraia-se finalmente no seu domingo.
As crianças vivem à solta por aqui, onde o mar deslaça dia & noite as suas ondas e elas, as crianças, dão cambalhotas e correm chapinhando a água dócil, entre pequenos sal/tos de quem está mesmo felizmente feliz e quer, continuar assim, sem precisar de o querer.
Há gazelas morenas, umas a seguir às outras, é difícil acompanhar com a merecida atenção tantos ritmos ondulantes e belos, sob este sol de Deus.
Passa uma caipira [2] com o peso dos anos no rosto grudado pelo sal que vagueia pela aragem e com uma caixa transparente no braço leva ovos de codorniz, camarão cozido, umas comidas que outros irão comprar, com certeza.
Olhando para trás, vejo 2 candeeiros públicos ainda acesos, o que não me espanta (pois em Portugal também acontecem estes descuidos) a despontarem entre as cabeleiras verdes das árvores sossegadas e claramente alheadas do assunto. É de lá - dessas bandas - que chegam até aqui aquelas músicas populares, sempre a tocarem as esferas do coração. Muitas pessoas cantam-nas em grupos e alegram-se simplesmente assim.
Um papagaio caiu, tombou mesmo agora a meus pés e re/paro que é feito de plástico, que já foi saco de supermercado + uns pauzinhos de coqueiro aliados, e ainda mais agora, o menino já o ergueu no ar e aquela coisinha frágil como Tudo, dá curvaS sozinho com a cauda louca sem tino e esburaca o espaço, rodopia veloz e depois ,,, cai outra vez no chão aparentemente sólido do mundo e a criança continua a ser criança a brincar e já é muito, tomara eu.
A menina do bar, mini-saia de ganga boa perna, camiseta vermelha desabotoada, bandeja prateada na mão esquerda, já aviou mais umas garrafas de Sol [3] a uns jovens que estão pr'ali num forrobodó evidente e regressa ao balcão, esvoaçando um olhar geral pelas mesas dos seus clientes.
Um bandozinho de sabiás-da-praia passa à frente do meu olhar a rasarem o grande areal, com cadeiras & mesas azuis, vermelhas e brancas e desaparecem numa curva uníssona do tempo, o que é feito deles? pensei, enquanto uma outra parte de mim se regala a misturar as cores do cenário em jogos infindáveis.
Lá adiante, lá mesmo ao fundo, onde o céu se afunda numa tira horizontal de água mais cintilante no brilho, faz-me lembrar que amanhã irei a St. º António de Alcântara, por onde um touro [4] passeia a sua estrela de cinco pontas na testa carimbada, em noites de lua cheia.
(São Luís. Estado do Maranhão. Brasil)
P.S.TEXTO DEDICADO AO poVo Brasileiro NESTE MOMENTO DA SUA HISTÓRIA .
. Segundo uma interpretação livre e segundo lendas populares, na lha dos Lençóis, D. Sebastião mora num palácio de cristal que se ergue no fundo do mar próximo à ilha considerada encantada. Consta que o rei vagueia pela praia, durante a noite, na forma de um touro com uma estrela de ouro (ou de prata), na testa. Se alguém conseguir atingir a estrela e ferir o touro, o seu reino será desencantado e D. Sebastião poderá regressar a Portugal.