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Pintura. J. A. M. |
Algures pertenço
ao silêncio
enquanto suspendo
da boca
o fio liso das
montanhas, recortadas
junto às luas.
Mansas mulheres
devoram-me as
esquinas às palavras
passeiam-se em
línguas estrangeiras
estão atentas às
suas imagens.
Hoje ocupo-me dos
pequenos milagres
da linguagem. Fui
esquimó europeu árabe
E em todos tive a
mesma voraz atenção
a mesma língua
muda transparente
em cada momento
senti
o vaivém dos
corações sem tempo.
Encontrei poetas
pessoas sentadas
cheias, outras a
dormirem cansadas
da eternidade.
Em cada um vi a
idade nua, fechada
por uma obra
silente nos olhos.
Em cada língua
soube falar calado
e não houve
alguém voltado de repente
olhando-me
atónito
como se
estivéssemos colocados fora
do lugar.
Por isso, toco o
silêncio. Muitas vezes.
Queimo-me nas
vertigens dos gestos falados
querendo
prolongar este talento tão ardente
e tão natural
a espera
fulminada pelos dons das mulheres
intuitivas
pois é delas esta
arte adivinhatória, este estilo
totalmente
original
abandonando os
campos absurdos da mente.
As paisagens
iniciais atam e desatam-me
o corpo. Os
silêncios vivem de um veneno puro
no éter,
desdobram a luz das estrelas
por onde outros
códigos cantam os corpos
comunicantes
em claros
encontros fora das palavras.
( in, O Triângulo de Ouro. J. A. M.)