São seres que se apagam em silêncio, vestidas de escuridão entre as pedras de granito onde se sentam e a vastidão do céu para onde largam as recordações de uma vida.
À volta, as poucas ovelhas colhem ainda da terra a seiva verde das ervas. Por perto, o cão castro laboreiro, faz um círculo divagado com os olhos e instala-se descansado.
O silêncio serpenteia-se nas ondas do ar a boca da noite abre as flores do coração curva os sons que tem sempre à mão e o tempo habita-nos mais ao sabermos nos olhos as sombras que se despedem das árvores onde os pássaros acolhem os primeiros tons do dia sob o lençol verde às tantas da manhã pelas cinco e tal ou quase assim começam a sinfonar uma visão acesa para quem esmorece ainda é cedo ainda é o segredo de haver um mundo contudo sagrado. - in, Recomeço Límpido, no Centenário de José Gomes Ferreira.2000 -
Escuta como o ar brilha em silêncio nas nossas veias lavradas e os cometas dos sonhos transportam minuciosas luzes para dentro da nossa escuridão, é um corpo sempre com um lado esquecido, o ouro, dizes, navega pelo sangue entra e sai pelos poros e o olhar torna-se o lugar das aparições, inaugura o tempo que volta escondido sob os primeiros sinais das madrugadas.
Entrego ao Mundo a forma de alguns segredos transportados pela leveza distante do tempo, em cada palavra eu digo: uma vida uma estrela que devolve a luz e estremece no centro dos seus contornos deslocados destas lógicas onde os instantes da fala só deixam falar o que já é transparente.
“Um ser humano é parte de um todo chamado por nós de Universo, é uma parte limitada no tempo e no espaço. Ele experiencia-se a si mesmo, aos seus pensamentos e sentimentos, como alguma coisa separada do resto - uma espécie de ilusão de óptica da sua consciência. Essa ilusão é uma forma de prisão para nós. A nossa missão é libertarmo-nos dessa prisão, alargando os nossos círculos, para envolver todas as criaturas vivas e o todo da natureza na sua beleza.”
- Albert Einstein, “Ideas and Opinions”. 1954. (Tradução livre) -
"Este governo desfigurou a escola pública. O modelo de avaliação docente que tentou implementar é uma fraude que só prejudica alunos, pais e professores. Partir a carreira docente em duas, de uma forma arbitrária e injusta, só teve uma motivação economicista, e promove o individualismo em vez do trabalho em equipa. A imposição dos directores burocratiza o ensino e diminui a democracia. Em nome da pacificação das escolas e de um ensino de qualidade, é urgente revogar estas medidas."
- in, blogue PROAVALIAÇÃO -
23.5.09
Brasil. Maranhão. Rio Preguiças. Foto de j.a.m.
ENCONTRO
Um barco desliza nas águas ao de leve sonoras. Enquanto a noite desce como um lençol suavemente escuro apagando o rio, que era azul e agora já é um espelho prateado deitado sobre o mundo. Alongado pela vastidão que se recolhe nos olhos de quem só olha.
Há em tudo uma paz impossível, e eu vejo o teu rosto e tu pareces não ser. Olho-te de novo, e tu olhas-me assim: tão perto e tão longe, no fundo de mim, que me deixas mais nu. Eu sei: és aquela que me ama do fundo das águas
que agora nos unem. Eu sou aquele que procura e te dá o silêncio inteiro das minhas duas mãos nas tuas. Pois, no fim desta escuridão somos sempre sozinhos. A partir de agora, entre nós não haverá mais segredos.
- In, Colectânea "Os Dias do Amor".Editora Ministério dos Livros.2009
Em cada gesto um ofício sem idade dizendo os corpos em sobressaltos entre as coisas circulares do tempo.
E quem já esteve em muitos lugares principia e acaba olhando o Mundo pelas suas formas e aí morre qualquer hábito e a vastidão da Terra com sementes há memória da Vida e das coisas que acontecem.
- In, O Triângulo de Ouro.Ed. Justiça e Paz.1988 - Prémio Revelação de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores.1987
Há porém um estado de absoluta nostalgia um coração selado sobre a emigração dos dias com um rosto partilhado pelos segredos do Mundo.
Não é a voz, não é essa desordem da luz nem a matéria ou a memória das palavras é outra a sedução despojada de qualquer brilho outra a distância abandonada lá no fundo vivo dos olhos.
Brasil. São Luís do Maranhão.2006 (foto de j.a.m.)
Os dedos sensíveis escutam as vozes do sangue. Vibram, morrem devagar nos gestos. Memórias e Mundos na ilusão de um tempo e de um lugar. Enquanto as luzes mais violentas apagam os contornos quando as asas do poema chegam ao fim.
(Imagens afundadas na Memória.11ª.) - In, A Primeira Imagem.1998 -
Primeiro foi uma sensação a veludo nas mãos, a carne à flor da pele era macia de um modo tão suave a pedir só mansidão e elas, as mãos, transcorriam bêbedas com todos os seus 10 dedos nas polpas sensíveis e eu lá ao fundo, no final da sensação, navegava com toda a preguiça esboçada do mundo, por aquele mar de novidades que o teu corpo me emprestava no silêncio ofegante da noite.
Estavas ali deitada, absorta no teu sonho inteiro de ser escultura para as minhas mãos, e eu sentia-te a crescer nas ondas da respiração e de um lado e do outro, ambos éramos mais próximos, como se houvesse uma indeterminada luz pelo meio, que tínhamos de possuir exactamente ao mesmo tempo.
Tudo ilusão. E, no entanto não era. Eu estava ali, tu também, éramos dois corpos com as portas abertas de todo. A aragem das mãos esvoaçando sobre a tua pele de veludo, era o que sobrava do silêncio de chumbo, que os nossos corpos mortais no fundo faziam. Havia entre nós um nó inteiramente aceso por dentro, onde as línguas mais aprumadas já não soltam palavras.
E os gestos criavam outros mundos, onde só nós cabíamos, onde só nós éramos quase perfeitos, à espera de o sermos.