José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

6.12.16

Imagens Afundadas na Memória





Um rosto visitado pelo sol
por onde é fácil
estar no Mundo
afastar as margens dos  sentidos
olhar para a Terra e dizer: - é este
o meu destino.

Com uma mão cheia de pensamentos se fabricam
as casas das idades humanas.
Com outra mão cheia de sentimentos
se põe em cada lado o lado mais vivo
de uma vida.
Respiramos por intervalos
entre os desejos desalinhados das nossas luzes
mais solitárias & mais íntimas.
E, quando os dias se afastam
há um canto absoluto abandonado em cada rosto
e no lado mais fechado do nosso corpo
deus pergunta-nos o seu lugar.



( José Alberto Mar.in, A Primeira Imagem, Ed. Sol XXI. Lisboa.1998)

25.11.16

a real preguiça ~ the real laziness

 
 
( foto . J. A. M.)
~ . ~ . ~

"For every thing that lives is Holy."
( William Blake)

Série: Msg a Garcia.


"I don’t know how to be silent when my heart is speaking."
( Eu não sei  ficar em silêncio quando o meu coração está a falar)


(Fyodor Dostoyevsky, "White Nights and Other Stories", 1848)
 

 

22.11.16

eixos & volantes



pobres seixos ambulantes
aos ziguezagues tantos tontos
perantre as luzes ke não enxergam

mas, lá no fundo de si próprios
há uma vela acordada assistindo
insistindo
aos desalmados ventos ke inventam
onde respiram, circulam & carambolam.




(Set. 2010)

19.10.16

A Poesia



Entre o alimento vermelho da carne sorumbática
uma veia de ouro única. Poesia.

É preciso encarnar o corpo anónimo
saber estar atento
para quando o excesso do ouro
cega as flores á superfície.

Aliciadas pelo perfume as mãos impacientes
recolhem sob a cegueira o brilho primeiro
e expõem á vida a escura transparência de uma voz
transbordada pelas imensuráveis dimensões evocativas
o corpo o mundo os universos
e os restos de poeira sobre a epiderme das coisas.



( in, " O Triângulo de Ouro , Ed. Justiça e Paz, 1988)
Prémio Revelação de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores-
1997.

1.8.16

A Bula

 
 
~
É com muito gosto que coloco como introdução , um link de  - A Bula -, secção do jornal on-line "Correio do Porto" (http://www.correiodoporto.pt/) dirigido por Paulo Moreira Lopes, onde participo com 6 poemas e um texto-poético, a convite deste.
Os poemas têm uma bela ilustração da minha colega de artes Fernanda Santos.


~ Obrigado Paulo  M. Lopes e equipe do Correio do Porto ~


31.7.16

por uma unha negra

 
 
Foi um tempo obscuro, escuro, mesmo negro. Atravessei-o com a juventude espalhada pela idade e todos os mundos que podia a encherem-me a alma até às marcas afloradas na pele. Por vezes, pensava que enlouquecia e então abrigava-me nas casas do silêncio á espera de escutar o fio tremeluzente da minha voz mais íntima. Outras vezes, saía pelo mundo fora, á procura de mais dias & mais noites umas a seguir ás outras como primaveras que se devoram com muitas flores vivas a saltarem pela boca, pelos olhos, pelo corpo inteiro e esburacado. Conheci gente, pessoas, corpos habitados por alguém, outros nem por isso, cheguei a conhecer os mortos que continuam por aí, de um lado para o outro, como imagens atrapalhadas adiarem sei lá o quê. Também, confesso, cheguei a ser tocado por alguns seres humanos que me deram minúsculas estrelas duradoiras, muitas vezes sem eu dar por isso. Ainda hoje as guardo, como pedras preciosas, soltas entre os seixos das minhas margens.
Foi um tempo de procuras, em que passei por pontes & pontes e nem sequer as via nem os rios dedicados aos seus mares, nem os lugares de um lado e do outro, por onde gastava o meu destino possuído pela dourada cegueira da juventude e por todos os copos de veneno que encontrava. Vi alguns amigos caírem para o interior de uma luz que nunca mais os largou, foram assim sozinhos para longe e nuncanunca mais.
Após muitas paisagens, comecei a ver que tudo à minha volta eram imagens que se soltavam de dentro de mim, onde eu não era chamado para o caso, nem propriamente ninguém, mas no fim de contas todos estávamos lá: pessoas, animais, plantas, pedras, mundo, vida e todos os universos conhecidos e por conhecer.
Comecei a olhar mais a luz, a luz claramente acesa, a primeira que vem de dentro das pessoas e das coisas e descobri um centro que não é centro nenhum, apenas me desloco, despido e nu, de centro em centro, no mapa circular da minha idade.
Sempre, com 1 deus presente em tudo e o amor íntimo e distante pelo que passa por mim.
 
(2006)
 
 


26.7.16

Onde o Sol é mais Perto



Às vezes pego no bloco. Pego na caneta. Fico assim horas a fio a olhar

Depois
desço o olhar
1 pirilampo aqui outro acolá na espessura da noite deste jardim
por detrás da sebe da casa há um sobreiro com ramos rugosos onde a cortiça respira & cresce sem darmos por isso e as folhas todas juntas formam  uma cabeleira que estremece e dança, muito espaçadamente, com a aragem que sopra dos lados do mar.

De repente, os repuxos calaram-se. Gotas de água escorrem de folha em folha e depois apagam-se no chão onde as raízes das plantas absortas se abrem ao desejo da sede. E as folhas cintilam sob o peso da luz que desce dos candeeiros. E são belas assim, nos seus verdes flamejantes contra as obscuridades à volta. Na superfície azulada da piscina, estranhamente ondulada, está a lua estampadamente enorme.

 
(Algarve. 2009)

Série: pequenas sabedorias ~ Series small wisdoms

    - J. A. M. -