José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

11.3.10

- Imagem Construída. j.a.m. -

práliviar (Calcinha Preta - baby doll)

Manoel de Barros - "Escova"

LANGUAGE IS A VIRUS (Laurie Anderson)

Quanto demora uma palavra a ser só luz?


Com a faca nas mãos que lapidam estrelas ainda vibra no ar

a demasiada luz cega nos olhos e há sempre imagens que se prolongam esquecidamente à procura de um silêncio

que as enlace num só gesto assim é impossível ver

os contornos exactos de qualquer coisa, não é?

1.3.10

LAÇOS COMUNICANTES


Uma mulher negra coberta de panos amarelos sentada num banco de madeira pintado de verde,
no jardim.
No banco ao lado, um sr. negro de camisa e calças vermelhas-encarnadas, sentado num banco verde à sombra de uma árvore com folhas tenramente ainda,
no mesmo jardim.

O sino do relógio lá no seu alto, dá 6 badaladas bem compassadas ao ritmo do calor hoje abafado, será que vai chover?

Passam mulheres & mulherzinhas agrupadas, com a bunda arrebitada todas janotas em direção à igreja que já está apinhada de gente para a missa de domingo. Espreito de longe e parece-me haver ali um fervor amornecido a uma qualquer devoção.

No jardim, um casalinho namora espreguiçadamente num outro banco de cimento. Ela deitada sobre o colo do seu amor, ali à mão de semear e ele com as mãos dedilhando o corpo da sua paixão.Vejo a soltarem-se deles, devagarosamente, sombras que estremecem o mundo sem ninguém dar por isso. Evolam-se pelo ar cores vermelhas vivas & azuladasperfumadas de laranjas que até encantam as flores sonolentas à-volta.


Volto a dar 1 passeio pelas ruas centrais do Plateau. E volto ao jardim.
A meu lado está alguém com um ar de quem já não espera nada da vida e também não se rala com isso. Talvez esteja em plena divagação do seu ser, talvez seja o seu modo de passar pelos dias, talvez a luz do seu olhar esteja agora toda estancada no seu pequeno sol de dentro,
mas que me importa?

Passam mais meia-dúzia de moços todos coloridos, alegres, entretidos com eles próprios.
Ouço o barulho bastante de uma moto, que arrasta atrás um gajo de patins a deslizar por ali como gente grande……
lá vai ele a espalhar o seu imenso sorriso branco pela cidade cinzenta adiante…


(Cabo Verde. Ilha de Santiago)

27.2.10

SOL DI MANHÃ






- "Ouvi dizer" que o Paulino Vieira se chateou mesmo com as máfias instaladas nos mundos - das-artes- das - músicas - tb - e então retirou-se para se concentrar no ( seu ) essencial.
Continua a criar, claro, mas muito menos contaminado. Ainda há criadores assim. 1 abraço -

3.2.10

Série : O(s) GRITO(s)

- Trabalho da Patrícia - 1º Prémio no Concurso de Artes Plásticas 2008-09. Agrupamento Adriano Correia de Oliveira -.

2.2.10

Série : O(s) GRITO(s)

Texto Escrito por Mário Crespo que foi censurado pelo Jornal de Noticias dia 1 Fevereiro de 2010

Título: O Fim da Linha

Terça-feira dia 26 de Janeiro. Dia de Orçamento. O Primeiro-ministro José Sócrates, o Ministro de Estado Pedro Silva Pereira, o Ministro de Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão e um executivo de televisão encontraram-se à hora do almoço no restaurante de um hotel em Lisboa. Fui o epicentro da parte mais colérica de uma conversa claramente ouvida nas mesas em redor. Sem fazerem recato, fui publicamente referenciado como sendo mentalmente débil (“um louco”) a necessitar de (“ir para o manicómio”). Fui descrito como “um profissional impreparado”. Que injustiça. Eu, que dei aulas na Independente. A defunta alma mater de tanto saber em Portugal. Definiram-me como “um problema” que teria que ter “solução”. Houve, no restaurante, quem ficasse incomodado com a conversa e me tivesse feito chegar um registo. É fidedigno. Confirmei-o. Uma das minhas fontes para o aval da legitimidade do episódio comentou (por escrito): “(…) o PM tem qualidades e defeitos, entre os quais se inclui uma certa dificuldade para conviver com o jornalismo livre (…)”. É banal um jornalista cair no desagrado do poder. Há um grau de adversariedade que é essencial para fazer funcionar o sistema de colheita, retrato e análise da informação que circula num Estado. Sem essa dialéctica só há monólogos. Sem esse confronto só há Yes-Men cabeceando em redor de líderes do momento dizendo yes-coisas, seja qual for o absurdo que sejam chamados a validar. Sem contraditório os líderes ficam sem saber quem são, no meio das realidades construídas pelos bajuladores pagos. Isto é mau para qualquer sociedade. Em sociedades saudáveis os contraditórios são tidos em conta. Executivos saudáveis procuram-nos e distanciam-se dos executores acríticos venerandos e obrigados. Nas comunidades insalubres e nas lideranças decadentes os contraditórios são considerados ofensas, ultrajes e produtos de demência. Os críticos passam a ser “um problema” que exige “solução”. Portugal, com José Sócrates, Pedro Silva Pereira, Jorge Lacão e com o executivo de TV que os ouviu sem contraditar, tornou-se numa sociedade insalubre. Em 2010 o Primeiro-ministro já não tem tantos “problemas” nos media como tinha em 2009. O “problema” Manuela Moura Guedes desapareceu. O problema José Eduardo Moniz foi “solucionado”. O Jornal de Sexta da TVI passou a ser um jornal à sexta-feira e deixou de ser “um problema”. Foi-se o “problema” que era o Director do Público. Agora, que o “problema” Marcelo Rebelo de Sousa começou a ser resolvido na RTP, o Primeiro Ministro de Portugal, o Ministro de Estado e o Ministro dos Assuntos Parlamentares que tem a tutela da comunicação social abordam com um experiente executivo de TV, em dia de Orçamento, mais “um problema que tem que ser solucionado”. Eu. Que pervertido sentido de Estado. Que perigosa palhaçada.

1.2.10

Das Ausências

- Imagem Construída.j.a.m -

- a meu pai -


Nasci a 13 de Maio, a uma sexta-feira, e o meu pai partiu para outro mundo num dia 14 de Maio. Tenho a impressão, que apesar de moribundo, aguentou aquilo para, mais uma vez, não me fazer qualquer desfeita. O meu pai era assim: sensível às pessoas e muito atento ao seu filho. Também lhe agradeço este último gesto a selar toda uma vida de dedicação e amor, como pai, amigo e ser humano.

Ontem, às tantas da noite, quando me bateram á porta tão tarde, fiquei um pouco intrigado. Ia já de braço em riste para o puxador, quando vejo o meu pai já dentro de casa, com o seu ar circunspecto e um sorriso levemente matreiro de quem vê alguém com uma cara de espanto sem solução á vista.

-”Então Gé, como vai isso?”Falou-me no mesmo tom e com as mesmas palavras que ouvi N vezes, como quem pergunta:” Então filho, como vai essa Vida”.

-”Tá indo bem”, disse-lhe enquanto o olhava nos olhos para confirmar o que dissera. Lembrei-me que muitas vezes, quando ele estava deste lado, eu nem sempre era mesmo sincero, embora a resposta fosse sempre igual. Mais tarde percebia que não o tinha convencido. Conhecia-me de ginjeira.

-”Entre, sente-se ali no sofá. Toma alguma coisa?”.

-“Não, bem-hajas, agora não preciso de tomar nada, mas vamos lá até ao sofá”.

Sentámo-nos lado a lado, enquanto eu o olhava de soslaio verificando que continuava com os seus gestos pousados a reflectirem um sossego interior muito raro, nos dias que correm. A conversa facilmente desembocou, como não poderia deixar de ser, para os lados da Vida e da Morte. Demorámo-nos entre frases, sorrisos e silêncios só nossos a falar das coisas que só as palavras permitem. Depois, quando o dia já se começava a misturar na sala e a realidade daquilo tudo parecia demasiada e também já sentíamos ter esgotado o que nos ia na alma, o meu pai levantou-se, pôs-me uma mão no ombro e com um ar vagamente satisfeito, murmurou:

- “pareces cansado, não estás a precisar de ir dormir?”.

-“É, talvez sejam horas”, e levantei-me também dando-lhe uma palmada afectuosa nas costas. Dirigimo-nos para a porta que abri muito lentamente e quando me voltei para nos despedirmos com o abraço habitual de antigamente, eu estava ali, completamente sozinho.


(texto re+escrito. A 1/Fev./2010)

17.1.10

pensamentos

- Imagem construída. j.a.m. -


"Não só as coisas acontecem com as pessoas, (...) cada um gera também aquilo que acontece consigo. Gera-o, invoca-o, não deixa de escapar àquilo que tem de acontecer. O homem é assim. Fá-lo, mesmo que saiba e sinta logo, desde o primeiro momento, que tudo o que faz é fatal. O homem e o seu destino seguram-se um ao outro, evocam-se e criam-se mutuamente. Não é verdade que o destino entre cego na nossa vida, não. O destino entra pela porta que nós mesmo abrimos, convidando-o a passar. Não há nenhum ser humano que seja bastante forte e inteligente para desviar com palavras ou com acções o destino fatal que advém, segundo leis irrevogáveis, da sua natureza, do seu carácter."

(Sándor Márai, in 'As Velas Ardem Até ao Fim)


29.12.09

Mais Uma Porta

- Tunísia. j.a.m. -




podemos dizer
que a nossa vida inteira
nasce
do que pensamos & sentimos.























.












19.12.09

Série : O(s) GRITO(s)

(Não gosto nada de citações, mas, nestes tempos que correm, há coisas que vale a pena repetir)



O palhaço


O palhaço compra empresas de alta tecnologia em Puerto Rico por milhões, vende-as em Marrocos por uma caixa de robalos e fica com o troco. E diz que não fez nada. O palhaço compra acções não cotadas e num ano consegue que rendam 147,5 por cento. E acha bem.
O palhaço escuta as conversas dos outros e diz que está a ser escutado. O palhaço é um mentiroso. O palhaço quer sempre maiorias. Absolutas. O palhaço é absoluto. O palhaço é quem nos faz abster. Ou votar em branco. Ou escrever no boletim de voto que não gostamos de palhaços. O palhaço coloca notícias nos jornais. O palhaço torna-nos descrentes. Um palhaço é igual a outro palhaço. E a outro. E são iguais entre si. O palhaço mete medo. Porque está em todo o lado. E ataca sempre que pode. E ataca sempre que o mandam. Sempre às escondidas. Seja a dar pontapés nas costas de agricultores de milho transgénico seja a desviar as atenções para os ruídos de fundo. Seja a instaurar processos. Seja a arquivar processos. Porque o palhaço é só ruído de fundo. Pagam-lhe para ser isso com fundos públicos. E ele vende-se por isso. Por qualquer preço. O palhaço é cobarde. É um cobarde impiedoso. É sempre desalmado quando espuma ofensas ou quando tapa a cara e ataca agricultores. Depois diz que não fez nada. Ou pede desculpa. O palhaço não tem vergonha. O palhaço está em comissões que tiram conclusões. Depois diz que não concluiu. E esconde-se atrás dos outros vociferando insultos. O palhaço porta-se como um labrego no Parlamento, como um boçal nos conselhos de administração e é grosseiro nas entrevistas. O palhaço está nas escolas a ensinar palhaçadas. E nos tribunais. Também. O palhaço não tem género. Por isso, para ele, o género não conta. Tem o género que o mandam ter. Ou que lhe convém. Por isso pode casar com qualquer género. E fingir que tem género. Ou que não o tem. O palhaço faz mal orçamentos. E depois rectifica-os. E diz que não dá dinheiro para desvarios. E depois dá. Porque o mandaram dar. E o palhaço cumpre. E o palhaço nacionaliza bancos e fica com o dinheiro dos depositantes. Mas deixa depositantes na rua. Sem dinheiro. A fazerem figura de palhaços pobres. O palhaço rouba. Dinheiro público. E quando se vê que roubou, quer que se diga que não roubou. Quer que se finja que não se viu nada.
Depois diz que quem viu o insulta. Porque viu o que não devia ver.
O palhaço é ruído de fundo que há-de acabar como todo o mal. Mas antes ainda vai viabilizar orçamentos e centros comerciais em cima de reservas da natureza, ocupar bancos e construir comboios que ninguém quer. Vai destruir estádios que construiu e que afinal ninguém queria. E vai fazer muito barulho com as suas pandeiretas digitais saracoteando-se em palhaçadas por comissões parlamentares, comarcas, ordens, jornais, gabinetes e presidências, conselhos e igrejas, escolas e asilos, roubando e violando porque acha que o pode fazer. Porque acha que é regimental e normal agredir violar e roubar.
E com isto o palhaço tem vindo a crescer e a ocupar espaço e a perder cada vez mais vergonha. O palhaço é inimputável. Porque não lhe tem acontecido nada desde que conseguiu uma passagem administrativa ou aprendeu o inglês dos técnicos e se tornou político. Este é o país do palhaço. Nós é que estamos a mais. E continuaremos a mais enquanto o deixarmos cá estar. A escolha é simples.
Ou nós, ou o palhaço.

(Mário Crespo, 14/12/2009, in J.N. on-line)