José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

7.5.09

(Meiri)


Os lençóis negros da noite desciam, tombavam, adormeciam colados uns aos outros, como folhas que se voltam a juntar.

Depois de várias voltas por N ruas obscuras da cidade pareceu-me que era por ali que a festa começava a fervilhar. No passeio de uma rua desamparada, encontrei um banco á minha espera e pedi mesmo ali á Sr.ª da rolote uma cerveja bem gelada. Recostei-me, costas com parede e vice-versa, e pus-me a pastar vacarosamente o olhar à volta. Havia de tudo o que era gente, jovens em grupos soltos e felizmente assim, pessoas solitárias, alguns com ar de quem procura desespiradamente libertarem-se daquilo, outros já mais ancorados nas suas derradeiras sortes, havia casais apaixonados que nem pássaros azurumbados, havia também mulheres de todas as cores, e as mais belas prendiam-me o olhar por mais tempo e depois, desapareciam pelas portas dos vários bares de onde se soltavam canções às molhadas e, de quando em quando tudo aquilo fundia-se no fundo mais fundo de mim próprio e dava-me sede para mais uma cerveja.

Por cima, a grande escuridão universal salpicada de estrelas e uma clara sensação de vastidão completamente alheada.

A incerta altura, uma menina sozinha, por dentro e por fora, aproximou-se de mim, de cerveja na mão e sentou-se a meu lado. Depois continuou calada, ancorada e eu também não de cerveja na mão. Encostou a sua tristeza desarmada no meu ombro abrigada e eu comecei a falar. As minhas palavras eram peixes criados ali, para o seu mar. Sem darmos por isso, pusemos os olhos nos olhos e começámo-nos a beijar. O seu fundo sereno tinha outro olhar. E uma paixão qualquer apareceu naquele lugar. Claro que o dia nasceu sem nos avisar.


(Brasil. Fortaleza.2003)


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