( St.o António de Alcântara. Maranhão. Brasil. Foto: J. A. M. )
Estou na Ponta
d’Areia (1). Deitado ou sentado à sombra, aí uns 30 e tal graus.
O guarda-sol é cor
de mangas maduras e eis à minha frente o mar vivo e aceso. Do céu vários azuis
luminosos descem naturalmente sobre tudo o que é vida.
À minha volta, o
povo espraia-se finalmente no seu domingo.
As crianças vivem
à solta por aqui, onde o mar deslaça dia & noite as suas ondas e elas, as
crianças, dão cambalhotas e correm chapinhando a água dócil, entre pequeno
sal/tos de quem está mesmo felizmente feliz e quer continuar assim, sem
precisar de o querer. Há gazelas morenas, umas a seguir às outras, é difícil
acompanhar com a merecida atenção tantos ritmos ondulantes e belos, sob este
sol de Deus. Passa uma caipira (2) com o peso dos anos no rosto grudado pelo
sal que vagueia pela aragem e com uma caixa transparente no braço leva ovos de
codorniz, camarão cozido, umas comidas que outros irão comprar, com certeza.
Olhando para trás,
vejo 2 candeeiros públicos ainda acesos, o que não me espanta (pois em Portugal
também acontecem estes descuidos) a despontarem entre as cabeleiras verdes das
árvores sossegadas e claramente alheadas do assunto. É de lá - dessas bandas -
que chegam até aqui aquelas músicas populares, sempre a tocarem as esferas do
coração. Muitas pessoas cantam-nas em grupos e alegram-se simplesmente assim.
Um papagaio caiu,
tombou mesmo agora a meus pés e re/ paro que é feito de plástico, que já foi
saco de supermercado + uns pauzinhos de coqueiro aliados, e ainda mais agora, o
menino já o ergueu no ar e aquela coisinha frágil como Tudo, dá curvaS sozinho
com a cauda louca sem tino e esburaca o espaço, rodopia veloz e depois ,,, cai
outra vez no chão aparentemente sólido do mundo e a criança continua a ser
criança a brincar e já é muito, tomara eu.
A menina do bar,
mini-saia de ganga boa perna, camiseta vermelha desabotoada, bandeja prateada
na mão esquerda, já aviou mais umas garrafas de Sol (3) a uns jovens que estão
pr’ali num forrobodó evidente e regressa ao balcão, esvoaçando um olhar geral
pelas mesas dos seus clientes.
Um bandozinho de
sabiás-da-praia passa à frente do meu olhar a rasarem o grande areal, com cadeiras
e mesas azuis, vermelhas e brancas e desaparecem numa curva uníssona do tempo, o
que é feito deles? pensei, enquanto uma outra parte de mim se regala a
misturar as cores do cenário em jogos infindáveis.
Lá adiante, lá
mesmo ao fundo, onde o céu se afunda numa tira horizontal de água mais
cintilante no brilho, faz-me lembrar que amanhã irei a Stº António de
Alcântara, por onde um touro (4) passeia a sua estrela de cinco pontas na testa
carimbada, em noites de lua cheia.
(1)
Praia
localizada a cerca de 4 km do centro da cidade de São Luís, muito movimentada
principalmente aos fins de semana, pela população local.
(2)
Pessoa
humilde do campo, da roça, do interior do Estado.
(3)
Marca de cerveja brasileira.
(4)
Segundo
uma interpretação livre de lendas populares brasileiras, na lha dos Lençóis, D.
Sebastião mora num palácio de cristal que se ergue no fundo do mar próximo à
ilha considerada encantada. Consta que o rei vagueia pela praia, durante a
noite, na forma de um touro com uma estrela de ouro (ou de prata), na testa. Se
alguém conseguir atingir a estrela e ferir o touro, o seu reino será desencantado
e D. Sebastião poderá regressar a Portugal.
- Há quem
relacione estas lendas, com a possibilidade do “5º Império”.
(São
Luís. Estado do Maranhão. Brasil)
P.S.
Conto integrado no Livro: O OURO BREVE DOS DIAS.
Autor: José Alberto Mar.