José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

15.4.10

quandochegaráosoldaprimaveranestestemposassim?

- Imagem Construída. j.a.m. -

Momento Pardo



silenciosa como algodão aproximou-se do meu lugar, como algo que acontece. Já adaptado à silhueta, olhei-a de soslaio para ver o que sentia, pois adivinhara quem era muito antes de tudo suceder. Manteve-se esfíngica, como quem espera. Eu também, apesar de tudo.
No ar espesso que começou a ser entre nós formou-se uma nuvem com a imagem de muitas dúvidas.
"Eis 2 seres humanos expostos às suas auroras", pensei, sei lá porquê.
A luz das janelas era frouxa e tudo aquilo tinha um ar de gatos cinzentos.
A certa altura, impaciente com o peso das circunstancias, levantei-me e fui lá fora para ver se chovia.
Mas no calendário marcava mesmo a Primavera, faço-me entender?

14.4.10


- Imagem Construída. j.a.m. -

Mauro: O Poeta da Ilha. (São Luís do Maranhão)


Arrastava mais um pé do que o outro e eu reparei no seu ar luminoso abrir airosamente a noite. Ia a passar perto do meu lugar e eu senti logo que podíamos trocar algumas luzes. Convidei-o a sentar-se ali, por baixo da grande árvore nocturna. Vi o seu olhar inclinado para o meu copo e perguntei-lhe o que bebia. Não tardou a abrirem-se as nossas portas, uma de cada vez e cada uma no seu lugar mais claro e íntimo. Era um poeta e eu disse-lhe que também era um aprendiz de poeta. (Ele lembrou-se deste pormenor passado uns dias, quando à sombra de outra árvore mais diurna, voltámos a trocar meia-dúzia de luzes pessoais.)

Ele arrastava uma perna quando andava, mas falava sem arrastar nenhuma das suas asas. Aí, ele crescia em voos cheios de altura e distância e às vezes, descia um pouco, para recitar um poema seu que parecia ler no meu rosto. Eram sempre feitos de simplicidade e profunda lonjura e eu ficava mais pequeno a escutá-lo e a vê-lo com todo o orgulho do mundo, pois já éramos amigos.

Hoje, imagino-o a levantar a noite da sua ilha, livre como sempre, feliz e a cantar alegremente toda a escuridão que há na sua vida de poeta.

(2006.2010)

5.4.10

O Meu Olhar Abarcava


Da varanda o meu olhar abarcava o mar lá ao fundo da montanha, depois de esvoaçar por muitas copas de árvores e alguns tectos de casas, que não se vislumbravam à primeira vista desarmada.

Era neste palco plantado no meio da Natureza, que graças a deus ainda era muito viva ali, que me sentava na cadeira aberta ao sol e começava, continuava ou acabava os meus dias. No geral, entretinha-me a fazer pinturas com folhas, flores, materiais que colhia à-volta e esmagava entre os dedos e as folhas brancas que trouxera das europas.

Ao lado, os pássaros aproximam-se às vezes, mas q.b., e encantavam a minha concentração pois tudo estava unido e havia uma natural sinfonia no lugar. Cheguei a fazer, umas esculturas com pedaços de coisas que me tinham chamado a atenção na praia, nos caminhos que calcorreara pelas montanhas, sem parar para pensar, porque é que obedecia aquele impulso de carregar com elas. Tinha mais que fazer: as imagens eram tantas!

A varanda era para mim, o alto terraço onde o índio xamã se ergue para convocar as forças de tudo aliadas às suas forças.

E ao lado havia sempre mangas, vários frutos calados e coloridos, para onde eu olhava para olhar só as cores ou, às vezes, para trincar algo que adocicava a minha existência

e então - nessas alturas,

demorava-me a saborear as coisas da vida atirando o olhar para longe

até me esquecer






4.4.10

com as mãos no fogo

- foto. j.a.m. -

Por uma Unha Negra


Foi um tempo obscuro, escuro, mesmo negro. Atravessei-o com a juventude alarmada pelo corpo e todos os mundos que podia a encherem-me a alma até às flores da pele pintadas com muitas cores.

Saía das casas para fora, á procura de mais dias e mais noites umas a seguir às outras, como primaveras vivas devoradas com muitas flores a saltarem pela boca, pelos olhos, pelo corpo inteiro e esburacado.

Por vezes, pensava que estava à beira da loucura, e então abrigava-me nos cantos do silêncio, à espera de escutar o fio tremeluzente da minha voz mais íntima. Escutava-o, aprumava-me, desenhava meia-dúzia de âncoras e depois voltava a soltar-me.

Conheci, gente, pessoas, corpos habitados por alguém, outros nem por isso, cheguei a conhecer os mortos que continuam por aí, de um lado para o outro, como imagens atrapalhadas adiarem sei lá o quê. Também, confesso, cheguei a ser tocado por alguns seres humanos, que me deram minúsculas estrelas duradoiras, muitas vezes sem eu dar por isso. Ainda hoje as guardo, como pedras preciosas soltas entre os seixos das minhas praias.

Foi um tempo de procuras, em que atravessei pontes e pontes e nem sequer as via, nem os rios que iam felizmente suicidas para os seus mares, nem os lugares de um lado e do outro, por onde cumpria o meu destino possuído pela dourada cegueira da juventude e por todos os copos de veneno que encontrava.

Vi assim, alguns amigos caírem para dentro de uma luz que nunca mais os largou, foram, sem se despedirem de ninguém, sozinhos para muito longe e nuncanunca mais.

Após, muitas paisagens, comecei a ver que tudo á minha volta era uma imagem que se soltava de dentro de mim, onde eu não era chamado para o caso, nem propriamente ninguém, mas, no fim de contas, todos estávamos lá: pessoas, mundo, vida, animais, plantas, pedras e todos os universos que existem.

Comecei a olhar para ver a luz, a luz claramente acesa, a primeira que vem de dentro das pessoas e das coisas.

Descobri um centro que não é centro nenhum, apenas me desloco despido e nu por dentro, de centro em centro na mapa circular da minha idade.

Sempre, com o deus presente de tudo á minha volta e o amor íntimo e distante por tudo o que acontece em mim.


(2006/2010)

31.3.10

a arte de uma flor

- foto.j.a.m. -

O Turista Acidental



Estou eu numa cidade qualquer e nem sei o seu nome. Os primeiros dados têm haver com a Europa. A norte ou sul, a este ou oeste, não faltarão ocasiões para aprender tudo isso. Incluindo o seu nome, claro, que nada existe ao acaso. Mas, como disse, nada de referências
à priori.

Já há muito tempo que acalentava esta ideia que se tornou tão fixa que se fez 1 nó a desunhar.
Um dia. Parti para a solução.
Comprei um bilhete qualquer, dentro do meu orçamento da ocasião, e ainda estou a ver o rosto espantado de coisa nenhuma do sr. que tinha por missão, dar pequenos-papéis em troca de muito-dinheiro. "Como?" perguntou-me num suspiro de quem pouco mais ar tem para dar ao momento. Olhei-nos fixo nos olhos, para que a conversa não deambulasse demais, e disse-lhe: "é Isso, amigo, dê-me esse bilhete que tem mais à mão. O sr., como bom funcionário público deste país, acatou de imediato a indicação. E, lá ficou aviar o seu ofício de escravo mecanizado enquanto eu desandava a chamar pelo meu boby .
Mais umas frases adiante, onde se inclui a viajem de avião os pormenores antes e depois - cá estou eu num aeroporto qualquer de uma cidade também qualquer, a esvaziar-me de mim e a tentar deixar-me tocar por tudo à- minha-volta . Como uma flor se abre à luz, a cada dia.



(boby, é o nome do meu malão de viagens, com 4 rodas e uma trela)

(30-Março-10)

30.3.10

Cowboy Junkies (Sweet Jane)

- Imagem Construída. j.a.m. -

As Leis da Desordem



paisagens e mais paisagens e eu entro e saio com a cabeça iluminada pela leveza por onde muito vivo. Altura, largura e comprimento, eis as 3 linhas, onde me puseram a respirar.


Mas - eu sonho. E os sonhos são estrelas domesticadas pelas almas de quem é pouco. Tudo se passa em silêncio, porque os Homens são demasiado barulhentos e afugentam o que é grande.

(2007/2010)