José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

15.1.18

por uma unha negra

foto trabalhada. j. a. m. 


















Foi um tempo obscuro, escuro, mesmo negro. Atravessei-o com a juventude espalhada pelo corpo e todos os mundos que podia a encherem-me a alma até às marcas tatuadas à flor da pele.  Por vezes, pensava que enlouquecia e então abrigava-me nas casas do silêncio à espera de segurar o fio tremeluzente da minha voz mais íntima. Outras vezes, saía pelo mundo fora à procura de mais dias & mais noites umas a seguir às outras como primaveras que se devoram com muitas flores vivas a saltarem pela boca, pelos olhos, pelo corpo inteiro esburacado. Conheci gente, pessoas, corpos habitados por alguém, outros nem por isso, cheguei a conhecer os mortos que continuam por aí de um lado para o outro como imagens atrapalhadas adiarem ou a esperarem sei lá o quê. Também, confesso, cheguei a ser tocado por alguns seres raros, que me deram minúsculas estrelas duradoiras, muitas vezes sem eu dar por isso. Ainda hoje as guardo, como símbolos preciosos soltos entre os seixos das minhas margens.
Foi um tempo de procuras, em que passei por pontes & pontes e nem sequer as via, nem o rio que lá ia para o seu mar, nem os lugares de um lado e do outro por onde queimava o meu destino possuído pelas douradas cegueiras das vertigens e por todos os copos dos venenos que tragava. Vi alguns amigos caírem para o interior de uma luz alquímica que nunca mais os largou, foram assim sozinhos para tão longe e nuncanunca mais.

Após muitas paisagens comecei a ver que tudo à minha volta eram imagens que se soltavam de dentro de mim, onde eu não era chamado para o caso, nem propriamente ninguém, mas no fim de contas todos estávamos lá: pessoas, mundo, vida, animais, plantas, pedras e todos os milhares de universos que na verdade existem para quem os vê.
Comecei a olhar mais a luz, a luz claramente acesa, a primeira que vem de dentro das pessoas e de todas as coisas vivas, que afinal é Tudo.
Descobri um centro que não é centro nenhum, apenas me desloco por dentro, despido e nu, de centro em centro, nos mapas circulares da minha idade, amparado pelo tempo que não existe.

Sempre, com o deus presente em mim e à minha volta e o amor íntimo e distante por tudo o que me vai acontecendo




(série: confluências, confidências, algo assim.Rascunho ~ 1988?)



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