foto trabalhada. j. a. m. |
Foi um tempo obscuro,
escuro, mesmo negro. Atravessei-o com a juventude espalhada pelo corpo e todos
os mundos que podia a encherem-me a alma até às marcas tatuadas
à flor da pele. Por vezes, pensava
que enlouquecia e então abrigava-me nas casas do silêncio à espera de segurar o
fio tremeluzente da minha voz mais íntima. Outras vezes, saía pelo mundo fora à
procura de mais dias & mais noites umas a seguir às outras como primaveras
que se devoram com muitas flores vivas a saltarem pela boca, pelos olhos, pelo
corpo inteiro esburacado. Conheci gente, pessoas, corpos habitados por alguém,
outros nem por isso, cheguei a conhecer os mortos que continuam por aí de um
lado para o outro como imagens atrapalhadas adiarem ou a esperarem sei lá o
quê. Também, confesso, cheguei a ser tocado por alguns seres raros, que me
deram minúsculas estrelas duradoiras, muitas vezes sem eu dar por isso. Ainda
hoje as guardo, como símbolos preciosos soltos entre os seixos das minhas
margens.
Foi um tempo de procuras,
em que passei por pontes & pontes e nem sequer as via, nem o rio que lá ia
para o seu mar, nem os lugares de um lado e do outro por onde queimava o meu
destino possuído pelas douradas cegueiras das vertigens e por todos os copos dos venenos que tragava. Vi alguns amigos caírem para o interior de
uma luz alquímica que nunca mais os largou, foram assim sozinhos para tão longe
e nuncanunca mais.
Após muitas paisagens
comecei a ver que tudo à minha volta eram imagens que se soltavam de dentro de
mim, onde eu não era chamado para o caso, nem propriamente ninguém, mas no fim
de contas todos estávamos lá: pessoas, mundo, vida, animais, plantas, pedras e
todos os milhares de universos que na verdade existem para quem os vê.
Comecei a olhar mais a luz, a luz claramente acesa, a primeira que vem de dentro das pessoas e de todas as coisas vivas, que afinal é Tudo.
Comecei a olhar mais a luz, a luz claramente acesa, a primeira que vem de dentro das pessoas e de todas as coisas vivas, que afinal é Tudo.
Descobri um centro que não
é centro nenhum, apenas me desloco por dentro, despido e nu, de centro em
centro, nos mapas circulares da minha idade, amparado pelo tempo que não
existe.
Sempre, com o deus presente
em mim e à minha volta e o amor íntimo e distante por tudo o que me vai
acontecendo
(série: confluências,
confidências, algo assim.Rascunho ~ 1988?)
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