José Alberto Mar. Com tecnologia do Blogger.

26.8.18

~ tranquilamente a dança continua ~




Caminhava sozinhamente feliz por um caminho muitos na floresta algures na ilha maior da Caraíbas quando me aconteceram vários pequenos milagres.

(permanente a fonte nunca se esquece de me matar a sede.)

1º atravessei uma ponte elaborada com paus & espessos cabelos de árvores entrelaçados sobre um chão de águas translúcidas até às cores dos peixes tontinhos de todo nas suas  curvas onduladas e depois, cada árvore era um momento feliz para os olhos e aconteciam muitas sucessivamente e em simultâneo, uma após outra havia uma  luz que estremecia a cada instante poisada no centro silente das deslumbradas flores no meu olhar, luz levantada pelas borboletas amarillas que celebravam uma cascata hediondamente abismada no meu prazenteiro banho bem demorado no corpo inteiramente nu, vislumbrando tokoloros e outras aves mais altas & longas nas asas suaves e mais depois, re+parei no tronco de um arbusto movendo-se sozinho sem dono arrastando o único caminho estreito que havia para dentro da mata, qual animal sem patas acossado por alguém o tinha quebrado pela espinha surgiu agora a metáfora, uns turistas intrigados também olhavam aparvalhados (& mal eu apareci eles rodopiaram e desapareceram em bando, eram brancos das europas) , foi mais um espanto ali aos meus pés *, novidades sem preço que a vida nos dá quanto a deixamos entrar e ainda + depois, encontrei duas crianças num outro rio, apanhavam peixinhos com um saco de serapilheira sem qualquer intenção após a brincadeira vi que também os bichinhos brincavam num balde roto de propósito(s) & lá regressavam ao seu imenso paraíso, uma era assim calada & presente no seu olhar triste de índia e a outra era viva nos gestos, com 2 pequenos corações  de ouro nos brincos de argola, a certa altura da nossa alta conversa bem rasa, inclinou-se para uma flor branca ali vizinha de nome mariposa(1) e eu saboreei o seu cálido aroma e, de repente, reparei melhor na luz submissa que os rostos das meninas continham onde o sol se demorava acordado, deleitado,deitado, enfim.
Saí de lá com 2 beijos repartidos & um aceno de mãos a fechar a curva do caminho de regresso para um outro mundo, até ao destino provisório daquela longa tarde ou já era noite? 





* passou-me pela cabeça que o leitor talvez pense que não entendeu bem esta écfrase, claro que a  compreendeu à sua maneira.



(1) " Em Cuba, é muito comum desde o século XIX em jardins e pátios, e também como uma espécie naturalizada em lugares selvagens com solos húmidos, como nas margens de rios. É muito apreciado desde os tempos coloniais pelas mulheres, que eram então adornadas e perfumadas com suas flores (…) Tanta é a sua popularidade, que em 1936 foi declarada a flor nacional de Cuba por uma comissão de botânicos e jardineiros. Isso parece surpreendente porque a mariposa não é indígena de Cuba. Mas eles, na sua escolha, levaram em conta não apenas a sua grande popularidade, mas também o facto de que, durante as guerras da independência, os seus intricados ramos serviram de esconderijo para as mulheres patriotas transportarem importantes mensagens clandestinas. Em Buenos Aires, foi plantada em um jardim internacional para representar Cuba, juntamente com as flores nacionais de outros países."


link:http://www.cubanaturaleza.org/es/flora-vegetacion/-flores/-flor-de-mariposa-white-ginger-hedychium-coronariu.html


Tope de Collantes, Cuba. Agosto-2018.

( Rascunho Nº 22)

beija~flores

- foto tranformada por j. a. m.,  de mural cubano, Habana -
-
Música do grupo Calcinha Preta: https://youtu.be/Ir_D0sfAlXw

22.8.18

postais























" Perhaps it’s time we realize that consuming more news about the world around us is not the way to improve it (or ourselves), personally or politically. "















( foto : j. a. m. )

Nanan - Casa da floresta: https://youtu.be/fPeExiJIqUc

Chá de tília



aconteceu-me 1 sonho.
E, de repente ~ vi que tudo é real.
O amarelo dos girassóis deslocou-se
para o esquecimento
& se fez ouro na 8ª retina da sinfonia
e depois eu vi uma abelha procurando mel
ke eu bebi no chá de tília
docemente saboreio a vida
que dEus me está a dar 


( raskunho N 10.08-2018 )

oVnis

imagem trabalhada: j. a. m. 
~
https://youtu.be/0e0txlm7KUo















20.8.18

menina com flor no 3º olho

imagem trabalhada  por  j. a. m., a partir de foto de Diogo F. Lastra.
~

" Pela sua natureza, o Atman é eternamente livre, sem forma e está além de qualquer ação. Sua identidade com os objetos é imaginária, irreal. Dizemos “o céu é azul”, mas o céu tem alguma cor? "

Shankaracharya


https://youtu.be/aP8THYfozHg

Crazy ! Clarence Bekker ( playing fOr chanGe ;-)

postais

foto~trabalhada  de  j. a. m.
 na "calle" de um bar reconhecido, em Havana.  Tem haver com 1 escritor
que viveu , segundo soube através do próprio, 20 anos em Cuba.

18.8.18

msg a Garcia.


" por que temos tanta necessidade de encanto e beleza? Porque a beleza e o maravilhamento fazem parte da nossa essência fundamental. Por isso, estamos sempre buscando objetos, paisagens ou pessoas para projetar o que somos intrinsecamente ".

( Paulo e Lauro  Raful)

~ https://youtu.be/VPAXwfosBQc ~

27.7.18

postais

" Os ácaros apresentam uma alimentação muito diferenciada entre os grupos, podendo ser parasitas (...) alguns grupos são predadores (...) " - Wikipédia. 

- Moon In Water - Underworld -

24.7.18

Msg a Garcia.



Morfeu: A matrix está em todos os lugares. Está em tudo à nossa volta. Mesmo agora, neste quarto. Você pode vê-la quando olha pela janela ou quando liga a sua televisão. Você pode senti-la quando vai trabalhar… quando vai à igreja… quando paga os seus impostos. É o mundo que foi colocado diante dos seus olhos para cegá-lo e mantê-lo longe da verdade.

NeoQue verdade?

Morfeu: que você é um escravo, Neo. Como todos os outros, você nasceu em servidão. Numa prisão que você não pode saborear ou ver ou tocar. Uma prisão para a sua mente”. 


(Matrix)


P.S. " Por favor, não responda para esta caixa postal, destinada exclusivamente ao envio de mensagens informativas".

22.7.18

em Abril águas 1000



às vezes à noite, cem nadas para fazer, pego no bloco pego na caneta e fico assim, horas a fio a olhar para o céu, depois a incerta altura, desço o olhar 
1 pirilampo aqui outro acolá na espessura da noite por detrás da sebe deste jardim há 3 sobreiros unidos com troncos rugosos onde a cortiça respira e cresce sem darmos por isso e as folhas todas juntas formam uma cabeleira que estremece  & dança, muito espaçadamente, com a aragem que sopra dos lados do mar enquanto pedaços de algodão dos álamos esvoaçam e uma sisão (1) algures espalha as pautas.

De repente, a chuva parou. Gotas de água escorrem de folha em folha e depois apagam-se no chão onde as raízes das plantas absortas se abrem aos desejos da sede. E as folhas cintilam sob o peso da luz que cai dos candeeiros. E são belas assim, nos seus verdes flamejantes contra as obscuridades à volta. Na superfície azulada de um pequeno lago provisório, estranhamente ondulado, está a lua estampadamente enorme.


(1) declarado a "Ave do Ano 2017", em Espanha.


(rascunho nº 151)

12.7.18

Diásporas ao Deus~Dará



já há uns bons tempos que não ia a um restaurante chinês e então hoje, sei-lá-porquê, deu-me para ir ao Restaurante da Rosa, mas afinal a Rosa andava por outros jardins…
Mal entrei, fui imediatamente recebido por uma jovem chinesinha que me abriu o espaço com uma larga simpatia que me surpreendeu. “Isto já teve melhores dias”, pensei. Sentei-me, retribuindo q.b. a simpatia da menina com um sorriso até sincero lá no fundo.
Comi algo comestível, e o melhor foi a salada, mastiguei esquecidamente os vegetais que depeniquei na travessa, com o complemento direto de um Evel branco fresco e para enlaçar a coisa no fim: café & saqué de rosas.

Enquanto o laço não acontecia, olhei à volta para os altos-relevos e as pinturas com o tal brilho eclético dos plásticos o que me seduz muitas vezes são as palavras desenhadas em mandarim, e olhando-as traço a traço, invento traduções rocambolescas, pois só cada uma dá pano para mangas.
Ponho-me a observar, comedidamente é claro, a empregada chinesinha bem acompanhada pela luz morna do local, fininha, impávida, e tentei adivinhar-lhe algo de dentro dela mesmo, para além da epidérmica empatia já demonstrada.
Não estava a ser fácil chegar a outros portos... 

O café e o respetivo anexo chegaram, a pikena estava por aqui há 1 ano, respondeu-me, com o seu ar naturalmente aprumado, já arranha o português do cardápio e até um pouco mais e, mais uma vez, aquela incerteza de eu a olhar, olhos nos olhos, e ela espreitar-me sei lá de onde. Disse-lhe que era um antigo cliente da casa, perguntei-lhe onde parava a Rosa e ela disse algo de “Avero” (Aveiro?), acrescentei mais umas lérias oportunamente circunstanciais tentando prepará-la psicologicamente para me oferecer, por decisão própria se possível, o 2º saqué de rosas, que afinal no tempo da Rosa era trigo limpo, ai que porra.

E eu gosto deste “bagaço”, não sei bem se é pelo saqué em si e o seu efeito em mim, se é pelas rosas, pois eu amo todas as flores, eu amo as cores, eu amo os aromas, as suas elegâncias, os silêncios, as sombras, a permanente entrega aos outros e a si próprias, Oh! como eu amo as flores. Sempre tranquilas sempre à mão de semear de qualquer mão amiga ou matreira, eu amo despudoradamente estas criaturas de deus, que não se cansam de me ensinar coisas das artes e da vida.

Entretanto dediquei-me ao café e ao tal néctar, que acontece em cálices pequenos, rendilhados com dragões a fumegarem linhas curvas, e eis a piada da primeira descoberta: quando a coisa está cheia, a gente ao beber o primeiro gole repara que lá no fundo está uma sr.ª toda descascada numa pose abertamente descarada e a gente olha e das duas uma, ou ficamos enlevados eternamente por caminhos lúbricos & afins ou então continuamos a bebericar, pois em princípio é este o objetivo do ato, enquanto a provocação se vai diluindo no fundo vazio do olhar, até desaparecer de todo.

Bá-lá, entretanto a música? suave & calma parece mal dizer oca, obrigava o maralhal ali presente, demasiado próximo ao meu território, a amainar a algazarra com que tinha entrado, o que eu agradeci muda e convictamente aos músicos chineses, aos deuses chineses e também portugueses e a tudo o que ocasionalmente tinha contribuído para tal. Cansado de vislumbrear, pedi a conta, que remédio, com um gesto arredondado de uma só mão (mas ainda com umas ténues esperanças do que seria provável acontecer-me) e o tal saqué de borla Lá Surgiu, meticulosamente colocado ao lado do raio da conta. Enfim, vale mais tarde do que nunca (dizem eles que um dia, um dia é que vai ser) e rejubilei saborosamente por ter reavido tal privilégio, atirando o último trago goela abaixo e sentindo-me deliciado com o fogo que se extinguiu melodiosamente pelo corpo todo.

Com tais sortilégios acontecidos, saí para a rua bem senhor de mim mesmo e do meu destino, fogueei 1 cigarro no meio da noite e algumas estrelas permitidas pela névoa citadina deixaram-me que tal acontecesse: neste antro insano de concorrências, foi milagre !



(Rascunho Nº 216.Portugal.2010)



6.7.18

cem títulos


(...) falo-te das sombras acesas das koisinha da vida, essas paisagens atravessadas pelo rigor dos dias & das noites, exatamente como se todos os lugares tivessem a mesma forma do que és.
Vivemos por circunstâncias dizem, sempre dentro sempre fora, muito mais dentrofora do que pensas saber quando ainda pensas, com a tua liberdade, quando existe, e o nosso desconhecido destino comum nada distraído em nós.

frondosas árvores crescem sobre pedras.


(1999)

25.6.18

hoje deu-me para ir jantar fora



Hoje, deu-me para ir jantar fora. Ao restaurante mais próximo, dado que estava a chover e eu e os guarda-chuvas não temos uma relação lá muito íntima, mas com o tempo lá acabei por aceitar tal facto. O que a gente não acaba por aceitar, com o raio do tempo? Lá fui entre a noite bem escura e as gotas de água fria que me perseguiram até à meta pretendida e quando desemboquei na coisa é que me apercebi que amanhã será feriado e por conseguinte todo o pessoal da zona lhe deu pra ir prá-li.
Lá me alinhei aprumadamente na fila de espera depois de emprestar o (meu) nome ao men de serviço nos apontamentos lá fiquei entretido com o vái-vém corredio dos empregados, mais um ou outro personagem que sobressaia e me levava o olhar para lá onde acabava por se esfumar (as mesas fartas, as bocas a mastigarem abertamente, os vários planos arranhados das algazarras, os omnipresentes telemóveis pelo meio das batatas fritas as carnes a fumegarem, o ruido abrupto das 4 pernas das cadeiras juntas quando deslizavam, um prato que foi desta pra melhor forçando à despedida a presença obrigatória de muitos olhares, por aí…..)

e sem dar por isso já estava a ser encaminhado por um empregado conhecido que me levou pela mão (esta inventei agora :-), para uma mesa com duas cadeiras, onde obviamente só ocupei uma. Aparentemente. Dado que a outra, por debaixo da toalha de linho rafeiro, abandonada na queda, servia-me para apoiar confortavelmente as sapatilhas encharcadas de todo. Por cima da minha cabeça havia uma T.V. e no início estranhei tanta gente a olhar para mim. O meu ego veio ao de cima mas logo o despachei, pois tenho mais que fazer.
Dado a algazarra inopinada (em relação às minhas perspetivas iniciais), explico, não só pelo feriado já aludido mas também porque já começou a coisa do Natal e ele há grupos mais grupos a juntarem-se para se comemorarem e ainda bem quando chegou o empregado com aquele livro muito fino que só tem meia-dúzia de folhas habitualmente, mas aqui fica-se pelas duas, eu disparei-lhe logo a solução: ½ dose de açorda de camarão (lá são generosos nisto, já não é a 1ª  vez)  e o  maduro branco da casa ( é do Douro, bonzinho até à data), e aguardei pastando o olhar pela multidão de vozes e rostos e gestos e televisões ligadas nos 4 cantos do lugar, nesta altura do campeonato, ainda abandonadas de todo, quem diria? Felizmente o pedido não demorou a ter resposta, pois já estava a esgotar o cardápio visual & sonoro. Debrucei-me sobre o assunto em questão e isolando-me do mundo à-volta, saboreei o repasto, pois realmente a fome é negra, como dizem os pobres pois os ricos ainda não chegaram lá e com a noite da alma onde vivem ainda mais, depois havia ali mesmo à frente do meu nariz mais 1 camarão rosadinho que nem as bochechas de uma minhota, mais uma conchinha para escancarar, mais uma colherada de açorda com orégãos & a faca o garfo entrecruzando-se num bailado amistoso + uma golada do vinho fresco, tudo estava a ficar  mais claro e comecei a serenar os impetuosos ânimos um tanto ou quanto já exaltados do meu dele estômago que desde manhã cedo, não tinha vislumbrado niente. Fizemos as pazes, finalmente nunca é tarde para tal deslumbrante facto, a meu ver.

Mastiguei demoradamente, como é meu hábito, entretido com os minúsculos sabores que advêm de tal esforço pelos vistos compensatório para as papilas gustativas que bateram palmas em uníssono e  escortinando agora à-volta aquele mundo parecia-me longe. Tinha-me desligado. Aprendi esta pequena arte algures com um mestre budista que, mal me apanhou a suplicar-lhe pela iluminação, me enfiou numa gruta sozinho por um ano e tal. Foi numa alta montalha do Tibete (bem perto de um portal) toda alva de neve e quando saí de lá até voei. Bendito mestre.
Bons tempos...em que entre mim e os anjos apenas havia a diferença no comprimento das asas.

Depois regressei aos insanos ocidentes made in U.E. prá-ki made in U.S.A. prá-li, mais o Trump e o Kim naquelas poucas vergonhas, tudo no fundo feito num nó cego bué amistoso &  mafioso, e todas as tais minhas asas foram à vida. 1º fiquei desencantado de todo numa tristeza sem nexo ( e sem sexo) , depois caí numa depressão horrível e mais depois, logo a seguir, psicólogos psiquiatras pírulas um balúrdio de $ na farmácia [1]. Terra esta de danados... Também de pessoas simples, humildes e humilhadas tantas vezes, parece-me que só ás vezes damos por isso.

Após um café e um incendiário bagaço (fabrico caseiro de alambique, proibido nas Europas eles lá sabem o que fazem?) lá me dispus a declarar-me à noite que remédio, regressando a casa entre estrelas muitas e gotas de chuva agora prateadas pela luz descarada que descia da lua cheia.



mês do Natal( Rascunho Nº 241)








 [1] Onde, graças a Deus, me deixam pagar ao fim do mês quando o patrão me dá, também dizem: graças a Deus, o tal de ordenado mínimo.


Série: Labirintos Acesos

120X120 cm. Autor J. A. M. - 2018
~
Linkhttps://www.ted.com/talks/janna_levin_the_sound_the_universe_makes#t-277925

22.6.18

Blog: Gazeta de Poesia Inédita.


Celebro a vida todos os dias.


o silêncio serpenteia-se nas ondas do ar a boca da noite
abre as flores do coração curva os sons que tem sempre à mão
e o tempo habita-nos mais ao sabermos nos olhos as sombras
que se despedem das árvores onde os pássaros acordam
os primeiros tons do dia sob o lençol verde às tantas
da manhã pelas cinco e tal ou quase assim começam a sinfonar
uma visão acesa para quem esmorece ainda é cedo ainda há o segredo
de haver um mundo contudo sagrado.

( J. A M.)

Link: https://gazetadepoesiainedita.blogs.sapo.pt/jose-alberto-mar-celebro-a-vida-todos-4994

13.6.18

"os trabalhos e os dias"



é necessária uma longa preguiça
laboriosa distracção para que o acaso encontre
as portas do seu espírito.

é preciso aguardar atento

esses nomes estremunhados ainda
circulando sobre os corpos a espera
no sono disfarçado pelas mãos.



( 2001 ? )

5.6.18

coisas nocturnas



até que enfim o Porto hoje era uma cidade viva às 3 horas da manhã ainda havia uma chusma de gente nas ruas à volta dos Clérigos e enquanto resolvia comigo a estranheza da novidade, acabei por me sentar numa cadeira à frente do café Piolho. havia pessoal desordenado em grupos, falavam, riam, bebiam. Gostei. havia um aroma quente no ar & fiquei por ali o tempo de 2 finos frescos, ou foram mais?
Depois, atravessei a escuridão do jardim da Cordoaria, onde revi de soslaio, mas com atenção, as estátuas do Juan Muñoz. com aquela parca luz geral a gentinha do Muñoz ganhava um ar mais severo e bizarro. Mas, porque é que não estavam parados?

As extensas sombras pelo chão pareciam levitarem ao som dos candeeiros sobriamente acesos. ao fundo, ainda estalavam no ar as gargalhadas dos jovens, abrindo a noite a outras luzes mais.



( 2009. Rascunho Nº 213 )

25.5.18

Sinetes Lunares



à-volta era um lugar que, mal entrámos, se tornou ausente. Talvez houvesse um espaço, um tempo, quatro olhos duas pontes ambas para lá ambas para cá, sobre algo circular o tampo de mármore da mesa onde as palavras caiam finitas e havia estrelas a rebentarem sozinhas no desamparo dos dedos quando se tocavam. Bailando, bailando os  dedos finos uma alma sensível no fim das hastes, re/parei.

As gaivotas vinham açoitadas pelo mar sem pescadores e abriam os espaços altos à procura. Eram sombras nos intervalos apanhadas por acasos, quando olhava de soslaio pelas vidraças húmidas do café, já não eram. Ambos num fogo acontecido apesar de (não) darmos por ele. À-volta, mais uma vez, havia os outros longínquas sombras, e em pouco tempo, nem sombras. Por dentro aconteciam metafóricos medronhos nos seus etílicos desejos de serem mais -  do laranja ao ouro – algo que só na altura sentia ou sabia, crescia para cima & para baixo como nas plantas a seiva, nas galáxias as luzes vagabundas.

Agora vejo como fui vago nessa travessia.  Luz dos teus olhos bebiam a minha sede. E, era uma sede demasiado. Devia ter-te deixado viajar mais para dentro. Ensaiar-me nas danças do silêncio que fazemos para que aconteçam, expô-las desocupado. Escutar-te nos teus altares. Aguardar o fino ouro do teu mistério.


(J. A. M. )

17.5.18

Selfie

Foto: J. A. M.























Conceito da obra: adaptação ao mundo da "pós-verdade".

7.5.18

onde o Sol é mais perto



Às vezes pego no bloco. Pego na caneta. Fico assim horas a fio a olhar para o a noite do céu, depois a incerta altura, desço
o olhar

1 pirilampo aqui outro acolá na espessura da noite por detrás da sebe deste jardim há um chaparro com ramos ainda pouco rugosos onde a cortiça respira e cresce sem darmos por isso e as folhas todas juntas formam uma cabeleira que estremece & dança, muito espaçadamente, com a aragem que sopra dos lados do mar enquanto o algodão dos álamos dança no ar e uma sisão algures espalha as pautas.

De repente, a chuva parou.
Gotas de água escorrem de folha em folha e depois apagam-se no chão onde as raízes das plantas absortas se abrem ao desejo da sede. E as folhas cintilam sob o peso da luz que desce dos candeeiros. E são belas assim, nos seus verdes flamejantes contra as obscuridades à volta. Na superfície azulada de um pequeno lago provisório, estranhamente ondulado, está a lua estampadamente enorme.



( Algarve. Rascunho Nº218)
Foto: j. a. m.

25.4.18

Poema em saldo Nº 25



uma data que regressa
transparente à cabeça um sino
pendular nas cavernas do corpo
e então escrevê-lo é abrir as potências
do sangue, dos pés até à raiz
dos cabelos, deixar crescer
a vida circular dos dias
pelo silêncio poderoso
se fundamenta um olhar
um sonho uma estátua invisível
dentro da memória
ordena-se o esquecimento
mantendo sempre a respiração do Mundo
entre muitos e muitos horizontes.



( 1998)

12.3.18

HÁ GENTE QUE MANDA NA GENTE SÓ PARA SE SENTIR GENTE




há “gente” que só manda na gente para se sentir gente. Eu, cá pra mim, não gosto dessa “gente”. Prefiro, de longe, a gente que gosta da gente, sem lhe apetecer mandar na gente. Pois, essa “gente” que só gosta de mandar em toda a outra gente para se julgar gente, cá pra mim, não são gente mesmo. Porque se essa “gente” fosse realmente gente, entendia claramente que não é necessário haver gente-por-cima & gente-por-baixo, dado que toda a gente nasce despida e toda a gente vai desta para melhor, vestida por outra gente.
Mas, porque é que o raio que os parta dessa “gente” que continua a mandar em toda a outra gente, não começa por saber mandar neles próprios, para se tornarem verdadeiramente gente? Essa “gente” é mentecapta, idiota, inteligentes sem dúvida só que têm a inteligência ao serviço da estupidez, têm a esperteza do tamanho da astúcia, são inequivocamente infelizes, intranquilos, sem paz por dentro, desalmados até, mas que culpa tem a gente disso?  embora essa “gente” nos castigue continuadamente por isso. “Gente” deste & daquele ramo desta árvore putrefacta, crentes disto & daquilo, governantes grandes & governantes pequenininhos, lá vê a gente, aquela outra “gente” a escravizar, a ignorar, a enganar & a roubar a gente.

Claro que também há gente que se deixa mandar bem por essa “gente”, e então só é gente assim-assim, entre os 2 lados das gentes. Nesta coisa de haver gentes, “ser ou não ser é mesmo a questão “, pois não há meias-gentes, propriamente dito.
etc.




( Rascunho Nº 287.2005)