O Espanto Deitado
Primeiro
foi uma sensação a veludo nas mãos, a carne à flor da pele era macia de um modo tão suave e a pedir só
mansidão e elas, as mãos, transcorriam bêbedas com todos os seus 10 dedos nas
polpas sensíveis cada vez eram mais e eu lá no fundo, no final da sensação,
deixava-me navegar com toda a preguiça esboçada do mundo, por este mar de
novidades que aquele corpo me emprestava no silêncio ofegante da noite.
E
ela estava deitada, absorta no seu sonho de ser mulher para as minhas mãos e eu
sentia-a a crescer nos ritmos da respiração, e de um lado e do outro, ambos
éramos mais próximos, como se houvesse uma indeterminada luz pelo meio, que
tínhamos de possuir precisamente ao mesmo tempo.
Tudo
ilusão. E, no entanto não era. Eu estava ali, ela também, éramos dois corpos
com as portas escancaradas de todo. A aragem das mãos esvoaçando sobre a pele
de veludo, era o que sobrava do silêncio de chumbo, onde os nossos corpos
jaziam. Havia entre nós, um nó inteiramente aceso por dentro, onde as línguas
mais aprumadas já não dizem palavras. Os gestos criavam outros mundos, onde só
nós cabíamos, onde só nós éramos quase perfeitos espera de o sermos.